Coração-Sozinho

O Leão e a Leoa tiveram três filhos; um deu a si próprio o nome de Coração-Sozinho, o outro escolheu o de Coração-com-a-Mãe e o terceiro o de Coração-com-o-Pai.

Coração-Sozinho encontrou um porco e apanhou-o, mas não havia quem o ajudasse porque o seu nome era Coração-Sozinho.

Coração-com-a-Mãe encontrou um porco, apanhou-o e sua mãe veio logo para o ajudara matar o animal. Comeram-no ambos.

Coração-com-o-Pai apanhou também um porco. O pai veio logo para o ajudar. Mataram o porco e comeram-no os dois. Coração-Sozinho encontrou outro porco, apanhou-o mas não o conseguia matar.

Ninguém foi em seu auxílio. Coração-Sozinho continuou nas suas caçadas, sem ajuda de ninguém. Começou a emagrecer, a emagrecer, até que um dia morreu.

Os outros continuaram cheios de saúde por não terem um coração sozinho.

Ricardo Ramos, Contos Moçambicanos (1979)

Comentário:

Este conto moçambicano fala-nos sobre a importância de pertencermos a uma família, a um sistema, sendo essencial termos alguém que cuide de nós, que nos proteja, que esteja do nosso lado e que nos faça sentir que pertencemos a um lugar.

Coração-Sozinho traçou o seu destino ao escolher o seu próprio nome, que é uma verdadeira programação inconsciente. É como se o pequeno leão tivesse declarado que não precisaria de ninguém, já que seria eternamente solitário.

Enquanto os irmãos recebiam os cuidados e ensinamentos dos pais, evoluindo com o tempo, ele permaneceu sozinho e não conseguia caçar. Assim, o leãozinho aprendeu tarde demais que precisamos uns dos outros para sobreviver neste mundo.