Havia um homem que se chamava Namarasotha. Era pobre e andava sempre vestido com farrapos. Um dia foi à caça. Ao chegar ao mato, encontrou uma impala morta.
Quando se preparava para assar a carne do animal, apareceu um passarinho que lhe disse:
– Namarasotha, não se deve comer essa carne. Continua até mais adiante que o que é bom estará lá.
O homem deixou a carne e continuou a caminhar. Um pouco mais adiante encontrou uma gazela morta. Tentava, novamente, assar a carne quando surgiu um outro passarinho que lhe disse:
– Namarasotha, não se deve comer essa carne. Vai sempre andando que encontrarás coisa melhor do que isso.
Ele obedeceu e continuou a andar até que viu uma casa junto ao caminho. Parou e uma mulher que estava junto da casa chamou-o, mas ele teve medo de se aproximar, pois estava muito esfarrapado.
– Chega aqui, insistiu a mulher.
Namarasotha aproximou-se então.
– Entra, disse ela.
Ele não queria entrar porque era pobre. Mas a mulher insistiu e Namarasotha entrou, finalmente.
– Vai te lavar e veste estas roupas, disse a mulher. E ele lavou-se e vestiu as calças novas. Em seguida, a mulher declarou:
– A partir deste momento esta casa é tua. Tu és o meu marido e passas a ser tu a mandar.
E Namarasotha ficou, deixando de ser pobre. Um certo dia havia uma festa a que tinham de ir. Antes de partirem para a festa, a mulher disse a Namarasotha:
– Na festa a que vamos, quando dançares, não deverás virar-te para trás.
Namarasotha concordou e lá foram os dois. Na festa bebeu muita cerveja de farinha de mandioca e embriagou-se. Começou a dançar ao ritmo do batuque. A certa altura a música tornou-se tão animada que ele acabou por se virar.
E no momento em que se virou ficou como estava antes de chegar à casa da mulher: pobre e esfarrapado.
Eduardo Medeiros, Contos Populares Moçambicanos
Um conto oriundo da tradição oral de Moçambique com base num dos muitos costumes típicos no norte do país, onde a regra faz com que sejam os homens a integrar o núcleo familiar feminino quando se casam.
Um conto que nos fala da importância do casamento numa cultura que tem a família como base da sociedade e como a maior riqueza de um povo.
Talvez por toda esta dimensão que a família representa nesta cultura, o conto aborda a pressão que muitas vezes os homens sentem até encontrarem uma companheira para casar e constituir família, o maior património que podem ter. Namarasotha simboliza o homem solteiro e os passarinhos, por sua vez, simbolizam a sabedoria dos antepassados como raíz da nossa existência.
Os passarinhos orientam Namarasotha durante todo o caminho, na tentativa que se envolva em romances passageiros ou proibidos, representados no conto por animais mortos que vai encontrando. Ouvindo os pássaros, como quem ouve todos os que vieram antes, o homem acaba por encontrar uma mulher e construir uma família feliz.
Acontece que no final do conto Namarasotha volta ao início, pois não satisfaz o único pedido que a mulher lhe faz.
E a história recomeça.
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