“O Domingo de Páscoa é o dia para sentir que a vida verdadeiramente recomeça”
Tolentino Mendonça
A Páscoa, tradicionalmente celebrada como o momento da ressurreição de Jesus Cristo, transcende a sua origem religiosa ao se tornar um símbolo de renovação, esperança e transformação. Em pleno século XXI, este período reveste-se de significados ainda mais profundos, levando-nos a refletir sobre as complexas realidades do mundo contemporâneo e de todos os desafios que nos são colocados. Numa era marcada por rápidas mudanças sociais, políticas e ambientais, a celebração da Páscoa surge como um convite à reflexão sobre o que significa renascer, tanto no plano individual quanto coletivo.
Vivemos tempos de grande incerteza, bem sabemos. Mas ao mesmo tempo em que o mundo atravessa crises ambientais, sociais e económicas, com tensões geopolíticas em crescendo e desigualdades acentuadas, podemos viver a Páscoa como um sinal de ressurreição, na medida em que a ideia de um novo começo após o sofrimento não é apenas uma promessa espiritual, mas também uma metáfora para a extraordinária capacidade humana de se reinventar diante da adversidade.
Mais do que nunca, a humanidade é hoje confrontada com os efeitos das suas próprias ações, seja no que respeita à crise climática, à pobreza crescente ou ao esgotamento das estruturas sociais. Por isso, mais do que nunca, a humanidade precisa deste tempo de ressurreição que está a chegar com a mensagem de Cristo anunciando uma nova vida. Mais do que nunca, é urgente este espírito de renovação a que a Páscoa hoje nos convoca, pois extravasa em larga escala o processo de renascimento individual, sugerindo a força e a potência do coletivo na transformação e reconstrução de um novo mundo. Porque só coletivamente poderemos construir um mundo mais justo e equilibrado.
Em tempos de globalização e de tecnologia avançada, observamos uma crescente desconexão entre as pessoas e as suas raízes espirituais e culturais. Na verdade, imersos num ritmo de vida frenético, as práticas religiosas e espirituais, assim como as reflexões sobre o sentido da vida, parecem ficar em segundo plano. Por isso a Páscoa, mais do que nunca, pode ser uma grande oportunidade de nos reconectarmos com um significado mais profundo da existência e com a própria essência da natureza humana.
Neste momento em que a humanidade precisa um pouco mais de cada um de nós, o ritual da ressurreição é um convite especial à renovação interior, não apenas no âmbito espiritual, mas também nas escolhas e atitudes diárias. Um momento para refletir sobre os valores essenciais, como a solidariedade, a compaixão e o perdão. Se na tradição cristã a Páscoa celebra a vitória da vida sobre a morte, no mundo atual pode lembrar-nos da importância de celebrar a vida em todas as suas manifestações, em cada gesto de cuidado e de respeito pelo outro e por nós próprios.
A nível pessoal, este tempo de ressurreição que atravessamos pode revelar-se um verdadeiro tempo de renascimento, quer profissional, emocional ou mesmo espiritualmente, sendo uma grande oportunidade para abandonar velhos hábitos, crenças limitantes e padrões de comportamento, e assim abraçar uma nova visão de nós mesmos.
Por estar simbolicamente ligada à ideia de paz, esta Páscoa mostra-se como um apelo à reconciliação e ao perdão, num mundo onde os conflitos teimam dominar ainda muitas partes do planeta. A mensagem de Jesus, que no seu momento final pediu perdão para aqueles que o crucificaram, é um exemplo claro de como, através do amor e da compreensão, somos capazes de superar as maiores adversidades.
É tempo de celebrar a Páscoa, não apenas como um momento religioso, mas como um processo contínuo de transformação, renovação e de esperança. Na imensidão dos desafios à escala global e das crises sociais, o simbolismo da Páscoa ressoa com uma mensagem poderosa: a possibilidade de um novo começo. Um começo individual e coletivo que está ao alcance de todos nós.
Para que nesta Páscoa sejas capaz de “sentir que a vida verdadeiramente recomeça”, importa acreditar que isso é possível e confiar na força do coletivo que nasce da coragem de cada um ser um pouco mais e melhor. Porque confiar nos lembra que ainda somos humanos.
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