Um olhar sistémico para a dor que se manifesta no corpo

“A doença é o esforço que a natureza faz para curar o homem”.

Carl Jung

Há dores que o corpo guarda porque a alma não encontrou espaço para falar.

Na abordagem sistémica, compreendemos que o corpo não adoece sozinho, respondendo com precisão silenciosa às dinâmicas ocultas do sistema familiar. Onde houve exclusão, desequilíbrio ou desrespeito à ordem natural das relações, pode surgir um sintoma. Não como punição, mas como um pedido de reconexão.

Bert Hellinger chamou a isto as Ordens do Amor, que correspondem aos princípios que regem a harmonia entre os membros de uma família. Quando estas ordens são violadas, seja porque alguém foi excluído, porque os filhos tentam carregar o destino dos pais, ou porque há desequilíbrios profundos na troca, o amor encontra formas criativas (e por vezes dolorosas) de se expressar. O sintoma é uma dessas formas.

O sintoma é mensageiro. Ele não chega para ser combatido, mas sim para ser escutado. Muitas vezes, o que dói no corpo é o reflexo de uma história que não pôde ser contada. Um segredo antigo, uma perda não reconhecida, uma injustiça esquecida. Por amor, um amor cego e infantil, carregamos o que não é nosso. O corpo então grita o que o sistema tentou calar. “Por ti, eu adoeço. Por ti, eu carrego. Por ti, eu permaneço preso.”

Este movimento é profundamente humano, e é também o que mais nos afasta da leveza e da vida em plenitude.

A dor que se manifesta num órgão, na pele, num osso, raramente é apenas física. Cada parte do corpo tem uma simbologia profunda, ressoando com emoções e vivências ancestrais. Há quem carregue nas costas o peso de uma geração, quem trave na garganta palavras que não pôde dizer, quem leve no sangue uma memória de exclusão.

Neste sentido, podemos dizer que o corpo é um verdadeiro altar, um espaço sagrado onde a alma pede escuta, reconhecimento e ordem.

Curar, neste contexto, não significa apagar o sintoma, mas sim olhar com amor para aquilo que ele representa. Muitas vezes, é preciso devolver o que não é nosso. Deixar os mortos com os mortos. Reconhecer os que vieram antes, mesmo com as suas dores e falhas. Dizer sim ao destino, e sim à nossa própria vida.

Porque o que cura não é a resistência. É a entrega. É o amor adulto, que sabe ocupar o seu lugar.

A questão que se coloca perante um sintoma que surge é… de quem é que me aproxima? Quem é que este sintoma está a tentar manter vivo dentro de mim?

Quando nos deixamos tocar por estas perguntas, algo em nós se reorganiza. Porque, por vezes, o corpo só precisa que alguém diga:

“Eu vejo-te. Eu reconheço-te. E agora, sigo com amor.”