“Educar a mente sem educar o coração não é educação.”

 Aristóteles  

O regresso das aulas surge como um livro em branco. Entre o cheiro do papel novo, as mochilas arrumadas e o regresso às rotinas, nasce também um movimento mais silencioso e invisível, o da família inteira que se reorganiza para acolher o novo ano letivo.

Na realidade, não é apenas a criança que regressa à escola. É todo o sistema familiar que entra nesse movimento. Cada novo ciclo traz consigo muito entusiasmo e esperança, mas também medos antigos, expectativas guardadas, e até histórias inacabadas de gerações passadas.

Por vezes, sem percebermos, os filhos carregam sonhos que não são seus, dores que não viveram, fracassos e sucessos que não lhes pertencem. O olhar sistémico lembra-nos que, quando reconhecemos de onde vêm essas cargas, podemos devolver cada parte ao seu lugar e libertar as crianças para que sigam o seu próprio caminho, mais leves e inteiras.

Mais importante do que preparar a mochila é preparar o coração. Uma criança sente-se segura quando percebe que tem um lugar onde pertence, um lar, que é olhada com verdade e que os pais estão disponíveis como guias. São os pequenos gestos que fazem diferença. Perguntar como se sente diante do novo ano, agradecer pelo esforço de todos, reservar alguns minutos do dia apenas para estarem juntos, sem distrações. É neste espaço simples, mas profundo, que a criança/jovem encontra raiz e confiança para florescer.

A pedagogia sistémica, inspirada em Bert Hellinger, lembra-nos que aprender é muito mais do que decorar conteúdos, já que cada criança carrega consigo uma história inteira, pois existem vínculos invisíveis, lealdades silenciosas, memórias que atravessam gerações e sonhos que ainda esperam florescer. Quando a escola reconhece esta profundidade, deixa de ser apenas um lugar de saber e torna-se um espaço de pertença e acolhimento.

É nesse espaço que a criança se sente vista na sua singularidade, respeitada na sua origem, e descobre que aprender pode ser leve, natural e cheio de alegria. Um gesto de coragem que nasce do coração e da confiança em si mesma.

Mas, enquanto este acolhimento pleno não acontece em todas as escolas, cabe aos pais e cuidadores oferecer esse espaço em casa. São eles que podem escutar sem julgamentos, honrar os esforços, reconhecer emoções e dar à criança a segurança de que precisa para crescer.

É no lar que se plantam as sementes da confiança e da presença, que depois florescem na aprendizagem e nas relações dentro da escola e fora dela.

E talvez possamos levar connosco algumas pistas para este recomeço:

– Tratar o início das aulas como um ritual de passagem, onde se honra o que ficou para trás e se acolhe o novo com confiança.

Recordar as ordens do amor: todos têm direito ao seu lugar, os pais vêm antes dos filhos, e a vida ganha equilíbrio quando damos e recebemos na justa medida.

Escutar as nossas próprias expectativas e perguntar: “Isto é meu ou vem de antes de mim?” libertando os filhos do peso de carregar sonhos que não lhes pertencem.

Criar rotinas com presença, onde um simples jantar em família ou uma conversa antes de dormir se transformam em espaços de conexão verdadeira.

Nomear e agradecer o esforço de cada um, dos filhos, dos pais, de todos, porque o reconhecimento fortalece os vínculos e traz leveza ao sistema.

O início das aulas é muito mais do que o regresso à rotina. É um convite à família inteira para se rever, reorganizar e crescer em conjunto. Se o vivermos com consciência, presença e amor, este tempo transforma-se num momento de fortalecimento dos laços e de descoberta de novas formas de estar juntos.

Que este início escolar nos encontre disponíveis para recomeçar, não só com cadernos novos, mas com olhares mais ternos, palavras mais verdadeiras e corações mais livres e leves.

Feliz regresso às aulas!