“Só cantamos bem nos ramos da nossa árvore genealógica”, René Char
A rosa-de-jericó, também conhecida por flor-da-ressurreição pelas comprovadas propriedades singulares que apresenta de murchar para depois tornar a florescer, é originária dos desertos da região de Jericó, na Palestina. Esta rosa que morre para nascer de novo, tal como simbolicamente acontece ao ser humano ao longo da vida nos momentos de profunda transformação e dor, é uma planta que cresce e se desenvolve tanto melhor quanto mais difíceis forem as condições de sobrevivência do lugar onde se encontra.
Diz a lenda que quando a Sagrada Família foi forçada a atravessar as planícies de Jericó para fugir à fúria do Rei Herodes, a Virgem encontrou esta rosa no meio do deserto, tão delicada quanto resistente. Enquanto Cristo viveu na terra, as rosas-de-jericó floriram e embelezaram os campos, tendo secado e morrido quando foi crucificado. Três dias depois, quando Cristo ressuscitou, as rosas-de-jericó voltaram a florescer e a irradiar o seu inebriante perfume. São rosas que divinalmente expressam o ciclo da vida e da morte na matéria e que, de uma forma poética, quase profética, simbolizam a esperança da vida entre o céu e a terra.
A vida gosta de ser surpreendida e alimenta-se especialmente do que não se vê. Quando só acreditamos no que vemos, ao olharmos para esta rosa no momento em que está seca ou murcha, estado em que consegue permanecer durante anos, dificilmente acreditaremos que há uma vida nela à espera de voltar a nascer. Mas há, e é extraordinário vê-la florescer cheia de folhas verdes quando submersa em água numa espécie de potência que vem do invisível.
É fácil acreditar no que os olhos vêm. Mas acreditar no que não se vê é radicalmente transformador porque muda tudo, especialmente a forma como nos vemos e como vemos o mundo. Exige coragem, muita coragem, aquele impulso que vem direto do coração e desafia o verdadeiro conhecimento de ti próprio e, assim, o teu crescimento interior. Acreditar no que não se vê é autoconhecimento, a grande revolução de consciência que a humanidade tanto precisa.
Acreditar no invisível faz parte do maravilhoso mundo das crianças, mas também dos adultos que, por desconforto interno ou um qualquer pressentimento que chega quase sempre através do corpo, acreditam que a vida pode ser um lugar vivido muito perto da magia, do fabuloso mundo do fantástico e do milagre. Este convite para uma vida extraordinária, onde nem tudo é bom mas (quase) tudo é possível, vem da criança interior que temos dentro e que é tão mais feliz quanto mais formos capazes de abraçar o mundo invisível que é nosso, que nos define, nos condiciona e nos liberta também quando tomamos consciência de que somos o sonho dos nossos antepassados. E que por isso, extraordinariamente, não estamos sós.
Assim como a rosa-de-jericó submersa em água pode renascer, também nós, “regando” a árvore genealógica da nossa família poderemos despertar para uma vida mais autêntica e curar muitas dores. As nossas e as do nosso sistema. Atravessando e cuidando desta preciosa árvore da família, cuidamos de ser feliz, pois a verdade é que “só cantamos bem nos ramos da nossa árvore genealógica”. Quem não acredita no impacto invisível que a história dos antepassados tem na sua vida nunca terá a oportunidade de viver no estado do sábio aprendiz que sabe que não sabe tudo, que sabe que não vê tudo, e que sabe que nada na vida controla. A ideia de ser alguém que acredita no invisível, nas histórias dos antepassados que o corpo carrega, “na importância dos encontros fortuitos, felizes e benéficos, e o facto, o dom de agarrar, de caminho, a sorte, quando nos apercebemos dela e quando a solução nos surge, como que por acaso…” parece ser o grande segredo da saúde mental, física e emocional do nosso tempo.
No Affectum o invisível está sempre presente, tem muita força e um lugar muito especial. Acreditar para além do que diz a razão é um exercício constante de entrega e de confiança num mundo melhor, mais humano e verdadeiro. Uma espécie de fé. Fé na infância, fé na família e na potência dos encontros, da atração dos corpos e das almas, fé na amizade, no trabalho, no vazio de onde tudo pode brotar, no movimento de quem não desiste e nas escolhas que passam pelo coração. Fé no amor como resposta a todas as perguntas. Fé na paz no mundo inteiro. Fé no Pai Natal.
Porque a vida é um mistério para ser revelado em pequenas doses de magia no tempo certo, neste Natal entrega-te à contemplação de um encontro com o invisível e pede ao Pai Natal uma rosa-de-jericó. Porque acreditamos que, afinal, também acreditas no invisível…
Feliz Natal!
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