"A paz é a única forma de nos sentirmos realmente humanos" Albert Einsten

 

Pode-se olhar um conflito numa perspetiva de guerra ou de paz, de confronto ou de pacificação, de destruição ou de crescimento. A diferença está no que sustenta esse olhar: o medo ou o amor. Sendo “a vida 10% do que acontece contigo e 90% a forma como reages ao que acontece” (Charles R. Swindoll), resulta ser uma escolha de cada um o olhar que se escolhe para viver o conflito e, nessa medida, o agravar ou solucionar. E é aqui, na construção de uma sociedade pacífica onde todos cabem por igual, que a Justiça Sistémica se expande e ganha voz ao reconhecer que grande parte dos conflitos tem raízes profundas nas dinâmicas complexas do seu sistema (familiar, social, organizacional ou outro) e em crenças e/ou lealdades inconscientes, acreditando profundamente que humanizar é preciso e é urgente.

Olhar um conflito numa perspetiva sistémica é escolher a paz em detrimento de se poder ganhar ou perder, acreditando ser o conflito um possível lugar de encontro de seres humanos que se permitem conhecer melhor e ir além do aparente. Trata-se de um olhar que inclui todos os que compõem e fazem parte do conflito, sem exceção, e que respeita as regras ocultas que governam as relações humanas e de onde surgem todos os conflitos.

A Justiça Sistémica é, assim, um movimento expansivo de pacificação e de inclusão, que pressupõe antes de tudo, que se honre e respeite o sistema tradicional da justiça; se hoje podemos fazer de forma diferente é porque existe uma forma anterior de trabalhar o conflito, sendo desta experiência que antecede que resulta o conhecimento, a frustração e o sonho de fazer algo diferente.

O olhar sistémico aplicado nas questões do direito, e em todas as que atravessam o ser humano na sua complexidade, facilita e promove uma compreensão da vida segundo a filosofia deixada por Bert Hellinger. Uma adesão generalizada a esta filosofia de vida facilita a convivência humana, olhos nos olhos, permitindo que uns e outros se vejam para além do que fazem e do que têm. Respeitando as leis do amor (pertencimento, hierarquia e equilíbrio entre dar e receber), teremos uma maior possibilidade de viver no presente, no estado de adulto e de nos abrirmos a várias possibilidades de realização.

Quando olhamos um conflito refletido num processo judicial percebemos que esse conflito se manifesta em várias áreas (emocional, social, familiar, judicial, etc). Sucede que a decisão proferida pelo tribunal poderá resolver o que respeita a questão judicial, mas o demais, o cerne do conflito propriamente dito, fica seguramente por resolver, sendo que muitas vezes se multiplica e agrava. Isto porque, encontrar a solução é impossível sem aceitar e entender o que acontece dentro do conflito: a solução tem que vir de dentro, não de fora, como diz Bert Hellinger “a solução está dentro do conflito”. A solução é interna e pessoal, acontece no coração com o assentimento de quem se percebe adulto e responsável maior pela sua vida. Os verdadeiros conflitos, reais, profundos, vitais, encontram-se dentro das pessoas, no coração. Se assim é, importa encontrar acordos interiorizados que pacifiquem efetivamente as relações.

A paz não chega com a aplicação da lei porque, na verdade, uma sentença não cura o sistema em crise, nem muitas vezes um acordo estabelecido unicamente com a razão. O que importa é o caminho até chegar ao acordo: é aqui que acontece a (r)evolução e transformação. Havendo submissão, estará sempre em causa o desequilíbrio entre as partes e o acordo não trará paz. A paz resulta da pacificação das relações, do vínculo que se estabelece entre as pessoas, e este vínculo resulta, única e exclusivamente, do equilíbrio entre o dar e o receber.

A compreensão de que os seres humanos são parte de sistemas complexos leva-nos a perceber que as questões legais dificilmente poderão ser resolvidas de forma eficaz sem se considerar o seu contexto sistémico. É este o convite que faz o olhar ampliado da Justiça Sistémica quando nos diz que o caminho e a solução estão na observação das dinâmicas subjacentes (familiares, organizacionais, sociais, ou outras), ganhando aqui cada vez mais expressão as constelações familiares sistémicas, a terapia transgeracional e a psicogenealogia na descoberta das soluções mais equitativas e harmoniosas.

Quando falamos de Justiça Sistémica falamos de amor e de uma perspetiva inovadora e promissora no mundo jurídico que pretende integrar conhecimentos multidisciplinares, princípios terapêuticos e sistémicos na busca de soluções legais eficazes e compassivas. Trata-se de uma abordagem inovadora que moldará certamente o futuro da prática jurídica, abrindo novos caminhos para a resolução dos conflitos. Como nos ensinou a Madre Teresa de Calcutá, “JUSTIÇA SEM AMOR NÃO É JUSTIÇA”.

 

Artigo publicado na revista SIM

 

 

3 ª EDIÇÃO DO CURSO JUSTIÇA SISTÉMICA